Lembram daquele rumoroso caso envolvendo uma funcionária do HSBC de Olímpia, funcionários públicos municipais e aposentados do INSS, ocorrido entre 2008 e 2009, no qual C.C.C. é acusada de prática de crime previsto no artigo 171 (por diversas vezes) do Código Penal? Agora teve uma decisão, conforme publicação na edição de hoje, terça-feira, 20, do Diário Oficial do Estado-DOE. Mas, a condenação de Cláudia se deu pela apropriação do montante de R$ 32 mil, segundo a sentença de primeira instância.

Mas, as denúncias à época davam conta de que seriam cerca de 30 casos ou mais as fraudes praticadas dentro da agência, na Rua São João, pela funcionária de empresa terceirizada que atua no ramo de empréstimos consignados. Os funcionários públicos municipais e aposentados do INSS tiveram empréstimos feitos à revelia, que somavam mais de R$ 238 mil quando o caso veio à tona.

A sentença, proferida pelo juiz da 2ª Vara de Direito de Olímpia, Lucas Figueiredo Alves da Silva, imputou a Cláudia pena de 1 ano e 6 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e pagamento de 15 dias-multa, no valor mínimo legal. Mas o juiz decidiu que a pena privativa de liberdade fica convertida em duas penas restritivas de direito: prestação de serviços à comunidade pelo prazo da condenação e prestação pecuniária no valor de um salário mínimo ao Conselho Tutelar de Olímpia.

Leia, abaixo, a íntegra da sentença:

 

SP – Diário da Justiça de São Paulo – Caderno 4 – Parte I
OLÍMPIA
Criminal
2ª Vara Juiz de Direito: DR. LUCAS FIGUEIREDO ALVES DA SILVA.

20/03/2012-Processo nº: 400.01.2009.010781-9/000000-000 – Controle nº: 000448/2009 – Partes: Justiça Pública X CLÁUDIA CRISTINA CAIRES Sentença de fls.638/646: Vistos. CLAUDIA CRISTINA CAIRES, já qualificado(a/s) nos autos, foi(ram) denunciado(a/s) e está(ão) sendo processado(a/s) como incurso(a/s) no artigo 171, caput, por diversas vezes, na forma do artigo 71, caput, ambos do Código Penal, porque, segundo a denúncia: em datas e horas incertas, compreendidas no mês de junho de 2008 e agosto de 2009, na agencia do Banco HSBC BANK BRASIL, localizada nesta Cidade de Comarca de Olímpia, previamente ajustada e com unidade de propósitos com terceira pessoa não identificada, sabendo-se apenas funcionário da agência bancária vítima, por diversas vezes, valendo-se das mesmas condições de tempo, lugar e modo de execução, obteve, para si, vantagem ilícita, perfazendo um montante estimado em R$32,000,00, em prejuízo a pessoa jurídica de direito privado HSBC BANK BRASIL S/A BANCO MÚLTIPLO, após induzir e manter em erro Janaina Canevarollo de Campos, Natália Custódio Toledo e Franciele Carla Beltrame, todas funcionárias da agência bancária vítima, bem como a correntista June Clai Aparecida Nardelli Bitencourt, mediante a emissão de diversas cártulas de cheque falsificadas, bem como na falsificação de contratos bancários de empréstimos e no saque indevido de conta corrente das pessoas Edisilvio Joaquim Bittencourt e June Clai Aparecida Nardelli Bittencourt. A denúncia foi recebida no dia 02 de dezembro de 2010 (fls.413). O(a) réu(ré) foi citado(a) (fls.421v°), apresentando resposta à acusação (fls.463/468). Em audiência de instrução foram ouvidos o representante do ofendido e doze testemunhas (fls.563). Em seguida, o(a/s) acusado(a/s) foi(ram) interrogado(a/s) (fls.564). O Ministério Público apresentou alegações finais (fls.569/591) mencionando o seguinte: requer que a ação seja julgada procedente nos termos da denuncia. A defesa apresentou alegações finais com os seguintes argumentos: requer que sejam reconhecidas as preliminares. O Assistente de Acusação também apresentou alegações finais com os seguintes argumentos: requer que a ação seja julgada procedente nos termos da denúncia; que seja aplicado o artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal. É o relatório do essencial. FUNDAMENTO E DECIDO. Em primeiro lugar, transcrevo o tipo penal indicado na denúncia. Diz o artigo 171, caput, do Código Penal: Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento. A materialidade do crime restou comprovada pelos documentos (fls.13/59, 67/76, 81/88, 118/198, 203/305) pelo Boletim de Ocorrência (fls.62/64), pelo auto de colheita de material caligráfico (fls.312/313), pelo laudo grafotécnico (fls.327/330). Passo à análise da autoria. Carlos Eduardo mencionou que diversos clientes reclamaram de operações realizadas pela acusada, inclusive sobre as emissões de cheques. Afirmou que mais de cem aposentados compareceram na agência reclamando sobre contratos que não teriam celebrado. Também houve reclamações sobre a diferença de valores de empréstimos que tinham sido realizados. Esclareceu que diversos contratos sequer foram assinados, sendo que o dinheiro era liberado pelo sistema. Também esclareceu que algum funcionário do banco tinha que autorizar a negociação. Disse que alguns cheques tiveram como beneficiários parentes da acusada. A testemunha Natália, que trabalhava no banco na época dos fatos, mencionou que para ter acesso a certos dados a acusada teria que pedir os dados a um funcionário do banco, sendo que isso era feito normalmente. Afirmou que em certas ocasiões qualquer pessoa tinha acesso aos talonários de cheques. Relatou que o procedimento normal de formalização do contrato de empréstimo consignado, dizendo que havia a necessidade de passar pelo gerente para liberar. A testemunha Franciele afirmou que a acusada fazia empréstimos consignados para os aposentados, esclarecendo que ela tinha acesso a quase todos os locais da agência, inclusive onde eram guardados os talonários de cheques. Esclareceu que ela não tinha acesso aos dados de clientes, porque ela não tinha acesso ao sistema, acrescentando que tinha os acessos aos dados por meio de outros funcionários do banco, inclusive por meio de seu marido. Presenciou alguns aposentados reclamando sobre os valores dos empréstimos, sendo que tais pessoas foram encaminhadas à gerência depois que a acusada saiu da agência. Por fim, afirmou que viu a acusada em algumas situações indo até as mesas de funcionários dos bancos solicitando informações. Edisilvio afirmou era cliente do banco e que a acusada lá trabalhava. Esclareceu que ocorreu transações sem eu ir lá no banco, como por exemplos TEDs. Também disse que cheques foram emitidos indevidamente, afirmando que sequer chegou a receber os talonários. Esclareceu que os cheques foram depositados no Banco Itaú. Afirmou que a esposa do depoente fez um empréstimo com a acusada CLAUDIA e que a dívida foi quitada, sendo que foi refeito outro empréstimo sem a ciência. Afirmou que havia uma assinatura no contrato que não foi feita pelo depoente ou por sua esposa. Disse que alguns cheques foram depositados na conta de Luciano Cabreli, não sabendo se ele era amigo ou parente da acusada. June Clai disse que fez um empréstimo bancário por intermédio da acusada CLAUDIA, esclarecendo que nem precisou ir até ao banco. Afirmou que acusada foi até a casa da depoente, quando forneceu os documentos pessoais. Posteriormente, a acusada levou o contrato e o dinheiro até a casa da depoente. Tempos depois, começou a receber ligações afirmando que a depoente estava devendo. Além disso, afirmou que posteriormente foi feito um novo contrato de empréstimo. Em fase policial (fls.78), disse que lembrou o Sr. Aparecido, favorecido das transações, é cunhado da acusada. A testemunha Janaína, que era funcionária do banco na época dos fatos, confirmou que acusada tinha a função de fazer empréstimos consignados. Disse que ela não tinha a matrícula de funcionário para ter acesso a certos dados, mas tinha livre acesso nas dependências da agência, inclusive onde eram guardados os talonários de cheques. Soube do problema ocorrido com Edisilvio e June clai, relatando que esta era amiga de CLAUDIA que ligava no banco sobre um contrato de empréstimo. A testemunha João, que era gerente do Banco, afirmou que se lembra das irregularidades da acusada. Disse que houve aproximadamente 60 reclamações de pessoas sobre os empréstimos consignados. Esclareceu que havia um pré cadastro do cliente e depois era elaborado o contrato, quando então havia a necessidade da liberação. Disse que depois era gerado um contrato e havia necessidade da referida liberação, que no caso eram feitas por Rotilde e Paulo. Afirmou que era função/dever desses dois funcionários verificar a regularidade dos contratos, sendo que pelas evidências eles não verificavam. Afirmou que houve reclamações sobre TEDs realizadas sem a permissão do cliente. Esclareceu que a acusada tinha acesso a todas as dependências do banco, inclusive onde estavam os arquivos dos bancos e os talonários de cheques. Disse que o marido da acusada, que era gerente de pessoa jurídica, trabalhava na mesa do lado da mesa da acusada, e que ele tinha acesso total ao sistema do banco, podendo inclusive liberar o contrato. Afirmou que o Rotilde foi demitido por justa causa, sobre problemas de balanço contábil. Luciano emprestou dinheiro à acusada, que lhe deu cheques de Edisilvio como forma de garantia. Este, por sua vez, disse que os cheques tinham sido furtados do banco. As testemunhas Antonio, Marcos, Otacílio e Carmencita nada acrescentaram de relevante. A acusada, em seu interrogatório, negou a acusação. Em relação ao TED na conta de sue cunhado, afirmou que tinha emprestado dinheiro para June Clai, sendo que tal cheque foi dado como forma de pagamento. Nesse contexto, entendo que a condenação é de rigor. Ficou claro que a acusada agiu juntamente com outros funcionários do banco. Frise-se que a demissão de Rotilde em nada interfere no panorama dos autos, pois trabalhava em área diversa da acusada. Os requerimentos mencionados pela defesa sobre documentos não merecem prosperar, afinal ficou claro, na denúncia e nas provas produzidas que ela atuou em conjunto com outros funcionários. Ou seja, ficou provado que a acusada emitiu em seu favor e mediante meio fraudulento as cártulas microfilmadas (fls.32/33, 36/37 e 39/40), referentes à conta bancária titularizada por June Clai e Edisilvio, induzindo-os e mantendo-os em erro, bem como forjou a contratação de financiamento de Crédito Pessoal e nome deles (fls.42/45). Nesse contexto, entendo que a acusada deve ser condenada pelos quatro fatos especificados acima, restando devidamente caracterizada a continuidade delitiva. A tese do Ministério Público relacionada à habitualidade não merece prosperar, afinal o artigo 71 não menciona tal circunstância. Assim sendo, considero a ré como incursa no artigo 171, caput, do Código Penal, restando a individualização da pena, valendo lembrar que pena mínima é de 01 ano de reclusão e pagamento de 10 dias-multa. Na primeira fase da fixação judicial da pena, são as circunstâncias do artigo 59 que devem ser analisadas. No caso concreto, não há nada a ser considerado. Na segunda fase, são as agravantes e atenuantes que devem ser analisadas. No caso concreto, nada há a ser levado em conta. Por fim, na terceira fase, as causas de aumento e diminuição é que devem ser aplicadas. No caso concreto, nada há a ser levado em conta. Em razão da continuidade delitiva (art.71 do CP), tendo em vista que a acusada praticou quatro crimes, aplico a pena acima fixada aumentada em 1/2 (metade), perfazendo: 01 ano e seis meses de reclusão e pagamento de 15 dias-multa. Dessa forma, não havendo nada mais a ser analisado, torno a pena acima a pena definitiva. De acordo com o §2º do artigo 33 do Código Penal, o regime será inicialmente o aberto. Cada dia multa deverá ser calculado no mínimo legal (um trigésimo do valor do salário mínimo vigente), diante da ausência de elementos quanto à situação econômica do réu, e o valor deverá ser corrigido no momento da execução. Por fim, SUBSTITUO a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direito: prestação de serviços à comunidade pelo prazo da condenação e prestação pecuniária no valor de um salário mínimo a ser pago ao Conselho Tutelar de Olímpia/SP. Caso a(s) pena(s) restritiva(s) de direito não seja(m) cumprida(s), fixo o regime aberto para o cumprimento da pena privativa de liberdade já fixada, consoante o disposto no artigo 33 do Código Penal. Frise-se que quando há substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, seja qual for, inclusive a prestação pecuniária, caso haja o descumprimento das condições do benefício, haverá a conversão em privativa de liberdade. Nesse sentido, GUILHERME DE SOUZA esclarece que: Trata-se de incidente na execução penal. Não cumprindo as condições impostas pelo juiz da condenação, poderá o sentenciado perder o benefício que lhe foi concedido, retornando à pena original, ou seja, voltando à pena privativa de liberdade… Se, durante o processo executivo, ficar demonstrado que o sentenciado está, deliberadamente, frustrando o cumprimento da pena restritiva de direito, é natural que se faça a reconversão para a pena privativa de liberdade (Manual de Processo Penal e execução penal, 2ª ed., RT, SP, 2006, p. 333). Deixo, ademais, de fixar eventual indenização mínima, tal qual consta no artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, por não haver instrução a respeito de eventuais danos sofridos. A esse respeito, cito a lição de Guilherme de Souza Nucci: Admitindo-se que o Magistrado possa fixar o valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração penal, é fundamental haver, durante a instrução criminal, um pedido formal para que se apure o montante civilmente devido. Esse pedido deve partir do ofendido, por seu advogado (assistente de acusação), ou do Ministério Público. A parte que o fizer precisa indicar valores e provas suficientes a sustentá-los (Código de Processo Penal Comentado, 8ª ed., 2008, p. 691). Ante o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido. Assim, CONDENO o(a/s) réu(é/s) CLAUDIA CRISTINA CAIRES, como incurso(a/s) no artigo 171, caput, c.c artigo 71, ambos do Código Penal, a cumprir uma pena de 01 ano e 06 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e pagamento de 15 dias-multa, no valor mínimo legal. A pena privativa de liberdade fica convertida em duas penas restritivas de direito: prestação de serviços à comunidade pelo prazo da condenação e prestação pecuniária no valor de um salário mínimo ao Conselho Tutelar de Olímpia/SP. Após o trânsito em julgado, lance-se o(s) nome(s) do(a/s) condenado(a/s) no Livro do Rol dos Culpados. Custas ex lege. P.R.I.C. Com o trânsito em julgado arquivem-se os autos com as anotações devidas. Olímpia, 08 de março de 2012. (a.)LUCAS FIGUEIREDO ALVES DA SILVA – Juiz de Direito.; Despacho de fl: 651: Vistos.1. Recebo o recurso interposto pelo defensor da ré a fl.650.2. Dê-se vista dos autos ao defensor da ré para apresentar as razões de apelação, oportunamente dê-se vista ao Dr. Promotor de Justiça e assistentes da acusação para apresentar as contrarrazões. 3. Aguarde-se eventual interposição de recurso do M.P., ou trânsito em Julgado da sentença, após voltem conclusos. Int.. (Os autos se encontram com vista ao defensor do(a) réu(ré) para apresentar as razões de apelação no prazo legal). Advogados: GALIB JORGE TANNURI – OAB/SP nº:24.289; RODRIGO DO AMARAL COELHO DE OLIVEIRA – OAB/SP nº:158153 e/ou GILBERTO DUARTE SILVA – OAB/SP nº:287.986 e outros (Assistentes da acusação).