Eu tinha 20 anos apenas quando o cineasta Ingmar Bergman lançou, e foi grande sucesso, o filme “O Ovo da Serpente”, narrando o período entre as duas guerras mundiais, o período pré-nazista anunciado no ar. Naqueles idos, apesar da clareza dos fatos, sociedade e governos da época preferiram não enxergar a verdade, como se isto pudesse evitar a maior catástrofe provocada pelo homem até então: a 2ª Guerra Mundial.

O filme, uma metáfora, comprova uma coisa: o ovo da serpente, de encontro à luz, torna possível ver, através da transparência da casca, a serpente que irá nascer. Mas, muitos entre nós, em especial políticos, preferem a cegueira a ter que encarar a luz da realidade, os fatos. Li não me lembro onde, certa vez, que dos ovos de serpente só saem serpentes. Que é da essência das serpentes botarem ovos que engendram serpentes.

Vendo agora esta espécie de “incubação” de um velho filme no tocante à eleição para a Mesa da Câmara, veio-me à mente esta imagem. A da serpente, do ovo que a engendra, e do perigo que isso pode representar. Trata-se de político perdendo a identidade conferida a ele por uma esfera que deveria ser seu bem mais precioso: o povo. E vejam bem, falo aqui em ovo da serpente porque são hipóteses. Prováveis, mas hipóteses. Por isso, também, uso “incubação”, o tempo que medeia entre o princípio de uma causa e a manifestação dos seus efeitos. Ou, ainda, o estágio da elaboração, da preparação, o estado latente de algo a ser feito ou a acontecer.

Pois, sendo assim, este final de semana será de total insônia. De um lado, daqueles que querem ver o naufrágio de algo que parecia sólido até pouco tempo atrás. De outro, daqueles que, ao contrário, querem ver cumprido o acordo firmado sobre papel e assinado por homens cujas condutas pessoal e política até então tem sido ilibadas, acima de críticas tempestivas. O que esperar, então, destas eleições de segunda-feira vindoura, na Casa de Leis?

 O que esperar de um grupo de homens suscetíveis a todo tipo de ação e reação, atacados por ambos os lados, um cobrando a palavra empenhada, outro tentando virar o jogo pela sedução de cargos e outras benesses? O que pensar quando se sabe que há articulações dos mais diferentes calibres em curso, que vão varar as madrugadas até o dia fatal? E o que dizer de homens que fácil e aparentemente estariam se “lixando” para a opinião pública, como se fosse ela algo deletéreo e sem nenhum significado social?

Esquecendo-se talvez estes homens que esta mesma “opinião pública” foi responsável pelo fim precoce de muitas carreiras políticas promissoras que já surgiram nos horizontes desta terra de Curupira. Portanto, ela é a autoridade máxima a ser respeitada de forma incontinenti por aqueles que não querem “vestir o pijama” da aposentadoria extemporânea. E não vale, aqui, o “a população esquece”, porque ao que parece o povo anda caprichando um pouco mais na memória, talvez por ter à sua disposição outros meios de informação que não somente os tradicionais jornais e rádios.

Meios que, a todo tempo, estão bombardeando-os com “recalls” do passado distante e do passado não muito distante. De maneira que se “lixar” para a opinião pública, nos dias atuais, é muito, muito perigoso. Parcela deste povo estará na Casa de Leis na segunda-feira. E vai poder ver de perto e até quem sabe, olhar nos olhos dos seus representantes e neles ver o que suas almas deixarem transparecer. E vão levar aquela imagem consigo, para casa. E a cada amigo que perguntar vão transmitir exatamente o que viram.

Ou vão “pincelar” aquilo, com cores ainda mais distintas, porque uma das atribuições da “opinião pública” é exatamente opinar, num certo contexto formar opinião e, dependendo deste contexto, “deformar” imagens. Tudo a depender do que ver nos olhos dos homens que têm nas mãos o poder de, em parte, decidir seu destino presente e futuro. E é só com boas atitudes e firmeza de caráter que se pode garantir algo de bom ao cidadão no hoje e, principalmente, para o amanhã.

Infelizmente neste caso, o ovo da serpente só revelará o seu interior sob a luz fluorescente, talvez já altas horas da noite. E se ovos de serpentes só engendram serpentes, se serpentes só botam ovos de serpentes e se é da essência dos ovos das serpentes darem à luz…serpentes, todo cuidado é pouco.

Até.